Comunicação apresentada por Affonso de Dornellas na Secção de Heráldica
e Genealogia da Associação dos Arqueólogos Portugueses em sessão de 25
de Abril de 1923 referente ao parecer aprovado em sessão da mesma Secção
de 22 de Dezembro de 1922.
Fui pela Secção de
Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses encarregado de
formular um parecer e fazer um estudo sobre o brasão de Belmonte. Da
primeira parte já me desempenhei em 22 de Dezembro de 1922 apresentando
um projecto e parecer verbal, o qual foi aprovado na mesma Secção.
Do estudo detalhado
sobre esse brasão venho hoje comunicar o que deu origem ao referido
projecto, citando um pouco da vida histórica de Belmonte.
A base fundamental
deste estudo, foi o seguinte ofício:
– S. R. – Ex.mo
Sr. Presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses – Secção de
Heráldica. – Lisboa. – N.º 224. – Sendo esta Vila antiquíssima e não
existindo nem nesta Administração nem na Câmara Municipal documento
algum de onde se mostre qual o seu brasão de armas, venho pedir a V.
Ex.ª se digne dizer-me como é composto o referido brasão e qual a cor de
que deve ser o seu estandarte. Saúde e Fraternidade. – Belmonte, 27 de
Julho de 1922. – O Administrador do Concelho (a) Manuel Esteves de Matos
Proença. –
A Associação dos
Arqueólogos Portugueses, respondeu em 23 de Dezembro de 1922, enviando
um croquis do Brasão aprovado em face do meu parecer e indicando que o
Estandarte devia ser esquartelado de verde e de branco por serem estas
as cores das peças principais do brasão. –
Belmonte ou Belo
Monte, tem como o próprio nome indica uma situação privilegiada. É um
ponto de vista colossal. A majestosa Serra da Estrela desenrola-se na
sua frente como pano de fundo de um panorama assombroso. Avistam-se
povoações a grande distância salientando-se a Covilhã entre elas.
Belmonte na sua
antiguidade era do distrito da Guarda, passando para o de Castelo Branco
por decreto de 31 de Dezembro de 1853.
Concelho de longa
data até à sua extinção por decreto de 7 de Setembro de 1895, ficou a
vila anexada ao concelho da Covilhã, sendo porém o concelho de Belmonte
restaurado por decreto de 15 de Janeiro de 1898.
O primeiro foral de
Belmonte foi dado por D. Sancho I em 1188 e o segundo foi dado por D.
Manuel I em Santarém, em 1 de Junho de 1510.
Evidentemente teve
Belmonte o seu selo e portanto o seu brasão, pois, que assim sucede a
todas as Vilas e Cidades que tiveram foral dado pelos Reis da primeira
Dinastia.
Perdeu-se com
certeza, como também sucedeu a muitas outras terras com forais daquela
época. Se o Castelo de Belmonte não foi teatro de grandes façanhas, está
ligado á brilhante história de Portugal por muitos motivos e muito
principalmente por estar próximo da fronteira, servindo portanto de
baluarte de respeito. Os escritores antigos dão-lhe D. Dinis como seu
fundador.
A notável e
antiquíssima Família dos Cabrais, foram Senhores e Alcaides de Belmonte
e basta terem pertencido a esta Família os grandes portugueses, Pedro
Alvares Cabral e Frei Gonçalo Velho Cabral, para que Belmonte tivesse
uma notabilidade perfeitamente vinculada na nossa História.
Pedro Alvares Cabral,
o descobridor do Brasil, foi Senhor de Belmonte.
Foi a Família dos
Cabrais, a que mais extraordinários privilégios teve no decorrer da
História de Portugal.
Álvaro Gil Cabral,
vassalo do Rei D. Fernando I, era Governador do Castelo da Guarda,
tendo-se negado a entregá-lo ao Rei de Castela quando da sua invasão em
Portugal, pelo que foi recompensado com os senhorios de Azurara,
Manteigas e Tavares e as Alcaidarias dos Condados da Guarda e Belmonte
para si e para seus descendentes.
De facto, são ainda
dos nossos tempos os Condes de Belmonte, actualmente representados pelo
Sr. D. José Maria de Figueiredo Cabral da Câmara, 4.º Conde de Belmonte
e décimo nono Senhor da honra de Belmonte e Senhor de muitas outras
distinções.
Tem a Vila de
Belmonte a sua vida ligada à história de Portugal, duma forma tal, que
bem merece que não esqueça.
Tem a mesma Vila,
elementos perfeitamente transportáveis em pura heráldica para um brasão
que a caracterize e a defina.
E então proporemos:
– Em campo vermelho,
uma torre de prata sobre um monte verde.
Fica, portanto, o seu
lindo Castelo representado por uma torre, como é costume heráldico
nestas circunstâncias sobre um monte verde ou seja um monte belo para
representar o Bello Monte que é o interessante local onde a vila está
situada.
A bandeira deve ser
esquartelada de verde e de branco por serem estes os esmaltes das peças
que compõem o brasão.
Esta bandeira, como
aliás, as de todas as Cidades e Vilas, deve ter um metro por lado não
incluindo o espaço da bainha onde se enfia a haste que a sustém.
[Affonso de Dornellas.]
(…)
Já depois deste
parecer aprovado, encontrei no Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa, o
seguinte ofício:
Belmonte. – Il.mo
e Ex.mo Sr. – Cabe-me a honra de responder ao atencioso convite que V.
Ex.ª se dignou fazer à Câmara a que tenho a honra de presidir em, Carta
de vinte e cinco do mês de Setembro último, e é com maior sentimento,
que eu tenho que dizer a V. Ex.ª que não me é possível responder de um
modo satisfatório às exigências de V. Ex.ª.
O brasão genuíno
das Armas de que esta Câmara usava, foram no tempo da infausta invasão
Francesa, por ordem emanada de Junot mandado riscar a pico pelo então
Juiz de Fora desta Vila – Severino António da Silva Geraldes natural de
Alpedrinha, e hoje no Lugar em que aquelas estavam se acham a pintura
colocadas as Armas Reais. Não há memoria, nem tradição, nem quem forneça
informações sobre tal objecto, nem tão pouco nos arquivos desta Câmara
aparecem documentos alguns, por que todos naquela triste época se
desencaminhavam, conservando-se apenas o Foral dado a esta Vila por
El-Rei Dom Manuel, no Primeiro de Junho de mil quinhentos e dez;
referindo-se já a outro que lhe havia sido concedido por El-Rei Dom
Sancho Primeiro. É quanto sobre tal objecto se me oferece dizer a V.
Ex.ª de quem tenho a honra de assinar-me com a maior consideração e
respeito. De V. Ex.ª, Atento Ven.or Mt.º Obrigado. (a) José Soares
Cardoso. Belmonte 28 de Outubro de 1855.
(Texto adaptado à
grafia actual)
Fonte: DORNELLAS,
Affonso de, «Belmonte», in Elucidário Nobiliarchico: Revista de
História e de Arte, I Volume, Número I, Lisboa, Janeiro 1928, pp.
15-17. |